25 anos de canais legislativos no Brasil

08.02.2021

Conversamos com Érico da Silveira, diretor de Tv Senado.

25 anos de canais legislativos no Brasil

A TV Senado foi inaugurada em 5 de fevereiro de 1996. Sob a perspectiva da sua gestão, que balanço você faz desses 25 anos de existência da emissora?

A Tv Senado inicia suas operações quase conjuntamente com a legislação que permitiu a criação de canais legislativos no Brasil. Havia pouca referência. Em especial a C-Span americana, embora em um modelo bastante diferente. Portanto, a Tv Senado não tinha um modelo a seguir e foi se inventando e criando um caminho a seguir para as demais tvs legislativas do país. Inovações técnicas e de linguagem foram formatadas para transmitir um tipo de evento que não era, digamos, “television friedly”. Não era como futebol (embora eu ache que ainda é a melhor escola de transmissão de eventos ao vivo). E para além das transmissões? Como dar sentido e ser didático ao traduzir os projetos de lei ao cidadão não especializado na gramática das sessões parlamentares? A definição do escopo editorial, dos gêneros de programa, a característica peculiar da linguagem jornalística, o desempenho do papel de agência de conteúdos (temos uma Tv Agência), os formatos de programas de entrevista, os documentários, os debates... Todo o conjunto de produtos e serviços que dão forma e conteúdo a um canal de televisão - que também é um serviço público - foi se materializando e, do ponto de vista de hoje, há uma maturidade editorial estabelecida. O pioneirismo cobra seus preços, mas o desafio valeu a pena e a TV Senado é hoje uma referência a toda rede legislativa.

 


Para você, quais são os desafios da TV Legislativa no Brasil e na América Latina?

Este perfil editorial da comunicação legislativa estava, bem ou mal, estabilizado e estruturado. Mas os ventos mudaram para toda a mídia. A virada tecnológica do universo digital sacudiu a mídia profissional. Este balanço ainda não terminou e muita coisa vai se transformar completamente. A tão anunciada era digital foi alardeada desde antes de sua materialização. Haveria grande impacto: na arte, na linguagem, na cadeia produtiva, nas profissões do setor, nos equipamentos: tudo foi avisado com anos de antecedência. Mas se esqueceram de avisar COMO tudo seria materializado. Tem que fazer programas mais interativos! Mas o que é isso? Como seria esse programa? Ele seria “sexy enough” para a audiência? Ninguém soube dizer. Mas a teoria aconteceu, atropelada pela prática, que surpreendeu no tipo de interatividade, quando realmente chegou; na ousadia da linguagem, quando realmente tudo se atropelou e aconteceu como um tsunami. Já há alguns anos, o desafio para todo grupo de mídia é a sua renovação de linguagem para o mundo digital: o grau de interação com o público aumentou significativamente, a informalidade da linguagem, os recursos visuais e as modernices que polvilham a internet impõem este enigma a toda a mídia convencional, trazido pela esfinge das redes sociais: decifra-me ou devoro-te! O desafio no campo público é dobrado. Deve atender ao mesmo desafio, porém sem a estrutura sólida tecnológica e financeira de um grupo de mídia privado. E mais: a mídia pública precisa, ainda, ser diferente, sempre. Afinal, foi para isto que ela foi criada, atender funcionalidades que a mídia privada não atende. Mostrar de outra forma, atender outra estética...Enfim, tarefa nada fácil. Esta revolução na mídia tem suas peculiaridades na América Latina, fruto dos modelos de comunicação aqui existentes e de nossos problemas e soluções que afetam todas as áreas de forma sistêmica. A isto estamos acostumados. No caso das tevês legislativas, nem se fala! São canais geralmente subfinanciados, não institucionalizados, como anexos das comunicações das Casas. Quer dizer, basta multiplicar as dificuldades já faladas. Mas nossa Red Tal está acostumada a estes desafios...e a ALCAP também! O importante é enfrentar esse desafio renovando cada perfil editorial, mas sobretudo mantendo os mesmos princípios da missão do canal. No caso da TV Senado, a mesma missão dada a 25 anos atrás.

 

Como avalia o trabalho em rede das TVs legislativas, públicas e culturais?

Este é o caminho para as dificuldades que comentei: cooperação constante. Como a competição pelo anunciante não nos coloca em conflito direto, como não necessitamos do apelo comercial como negócio, podemos extrapolar as formas de cooperação, coprodução, exercer um relacionamento intenso de rede que pode trazer muitas surpresas boas. Campanhas internacionais, como foi a iniciativa do PakaPaka Ventanas al mundo! Iniciativa singela que tem o potencial se espalhar e provocar um tipo de engajamento surpreendente. O que nos impede? Sei que esta é a missão da TAL e creio bastante neste papel de articulação. Aliás, feliz cumple anos também à TAL por seus 18 anos! A trilha é esta temos que abusar da criatividade e ousadia. Não somente de formatos, mas de modelos de parceria editorial e ações de comunicação.

 

Além de transmitir as atividades do Senado Federal do Brasil, a emissora produz conteúdos jornalísticos e culturais. Como está o trabalho em tempos de pandemia?

 

Sim, claro. O centro da linha editorial é este da transparência da atividade legislativa, mas para o trabalho ser completo, é preciso esmiuçar os projetos de lei e discutir os problemas do país a partir do que é proposto no parlamento. Portanto, programas de entrevistas diversos, temáticos, com senadores, com a sociedade, programas de reportagens aprofundadas, documentais que trazem a História do país, mas também discutem nossa identidade e nossos problemas. Completam nossa linha editorial os programas culturais, especialmente música e literatura – por razões históricas da TV Senado.

 

A pandemia, a princípio, assustou e nos preservamos, com foco na segurança do trabalho, da saúde de todos e a responsabilidade jornalística. Logo de imediato, fomos convocados ao desafio como serviço público, como profissionais de comunicação e como ferramenta a serviço da democracia. Como disse o Secretário Geral da mesa do Senado, Luís Fernando Bandeira de Mello, em tempo de crise, o Parlamento não pode parar. Rapidamente o serviço público e a emissora pública e legislativa TV Senado teve que entrar em cena para auxiliar a garantir a realização das sessões segislativas. Foi um sucesso! Está tudo documentado neste documentário:

 


Portanto, a crise é oportunidade foi realmente o que ocorreu: em pouco tempo tivemos que fazer todo mundo entrar de casa e descobrimos o Brasil sem viajar! Conseguimos mais entrevistas, mais debates, fontes mais variadas e os formatos dos programas ganharam nova dimensão.

 

 

Que tipo de registro documental ou de bastidores da discussão legislativa é possível produzir numa emissora que tem também raiz institucional? Quais são os limites para a visibilidade da discussão política?

 

As redes sociais se tornaram um mundo que exige muita transparência. Às vezes até aparenta estar do avesso de tanto que se busca exibir o interior das coisas, conhecer a “realidade”, a “verdade escondida” e extrapola. Este cenário que se pretende transparente ofereceu uma outra face: a das fake news. Esta é, a meu ver a maior oportunidade para os veículos públicos responsáveis oficiais garantirem um certo grau de verdadeira transparência. Um compromisso que deve ser assumido por todos os canais públicos. Na véspera da última eleição nacional em 2018, você saberia dizer qual foi um dos portais de maior acesso que o cidadão buscou antes de ir votar? A página especial da Agência Senado com a lista de todos os candidatos, com descritivo de cada um, sua filiação partidária e informações básicas...seguras, verificadas. É ou não sinal de que chegamos a um certo ponto em que é preciso ter instituições nas quais você confia e as oficiais são obrigadas a ser responsáveis. Do ponto de vista específico da intimidade do trabalho do parlamentar, O fato é que o próprio parlamentar busca um grau maior de proximidade com seu público-eleitor-seguidor (não sei mais que nome usar). Hoje, somos cada vez mais bem-vindos por parte dos parlamentares em reuniões e audiências públicas e acho que se consegue uma participação nos bastidores bastante interessante.



Por fim, quero dizer que a a TV Senado está firme e forte em sua missão de ferramenta a serviço da democracia, pois sabemos que Democracia se faz não apenas no dia do voto. Democracia se faz todo dia, como diz nosso Slogan.